segunda-feira, 25 de maio de 2015

Sou paraense, sou papa-chibé!


por Jerusa Nina


Quando desço do avião em Belém, um forte sentimento que me aflora a assim que bato os olhos nos anúncios dos pontos turísticos é: “estou em casa”. Não que o Rio de Janeiro também não seja meu lar. Depois de tantos anos até poderia parecer ingratidão com a cidade maravilhosa, a qual amo de paixão.

Foto Margô Dalla
Belém - Foto Margô Dalla

Acontece que quando chego ao aeroporto da cidade onde nasci e fui criada, tenho a mesma sensação que muitos de nós nutrimos pela casa de nossos pais depois que casamos. Aquele saudosismo que nos dá a certeza de que sempre seremos bem-vindos.

Como todo paraense que vive fora do Pará, morro de saudade da minha comida regional. Sinto falta de degustar um Tacacá bem quente às cinco da tarde, de tomar um açaí com farinha de tapioca logo depois do almoço e de dormir na rede, para completar.

Sinto saudade da maniçoba, do caruru, do vatapá, dos variados sorvetes da Cairu e da pupunha melada na manteiga comida quente com o café com leite da tarde. Não precisa de pão.

Mangal em Belém - Foto Margô Dalla

As garças e flamingos do Mangal - Foto Margô Dalla



E vou além, se fecho os olhos já faço uma lista de todas as maravilhas. Sentir o cheiro da chuva das 15 horas, molhando o asfalto fervente, abrindo alas para o vento da Bahia do Guajará. E ver as garças voando do Mangal para a Praça Batista Campos, passando a poucos metros de nossas janelas em prédios arranha-céu. E todo este espetáculo sob o por do sol maravilhoso em seu tom vermelho amarelado.

Foto Margô Dalla
Até poderia parar por aí, mas como não mencionar os vários túneis de mangueiras centenárias que ladeiam as ruas, dando brilho aos casarões antigos da época áurea da borracha? Como se não bastasse, essas mesmas árvores nos premiam com seus frutos, precipitando suas sortes sobre nossas cabeças. Como catei manga na volta da escola, para comer com farinha d’água em casa...

Belém, a cidade que conta com seu vocabulário próprio, do “égua; te mete, mano; pior que é; vai nessa; tá, cheiroso; só porque tu queres; eras; tu alopras; olha já” e de tantas outras expressões que só quem é da terra vai saber dar a entonação correta nesta leitura. E fico triste por eu mesma já não ter o sotaque genuíno, involuntariamente perdido no meu falar.

Só tem lá, o pastel folheado crocante e quentinho, em forma de triângulo e com generoso recheio de queijo. Só lá, tomei refrigerante em saquinho com canudinho, para que o vendedor cauteloso não tivesse a garrafa de vidro quebrada nas décadas de 80 e 90. E, agora, mais ainda, só lá, vi abacatada (vitamina de abacate) ser vendida em aquários no ver-o-peso. 

Mercado de Ver-o-Peso - Foto Margô Dalla

Aquário mesmo, daqueles de vidro que se criam peixes em casa. Docinho de uva, com a própria fruta envolvida em um creme verde com açúcar que me leva as moedas embora. Casadinho, a parte preta e a parte branca. Sempre refleti sobre quem seria o marido, quem seria a mulher. 

Monteiro Lopes, banhado com Nescau em uma camada doce de trigo assado. Se eu fechar os olhos, consigo sentir o sabor de todos eles. E para trazer no corpo a marca da minha origem, para sobreviver a mais um momento de distância, sempre compro os perfumes, cujas fórmulas me são conterrâneas. A fábrica nem é mais a mesma. Até os nomes dos perfumes mudaram, mas teimo em procurar (e sempre encontro) pelo Matinal e pelo Naturele da antiga Phebo, porque eles me trazem um elo forte da infância: minha bisavó.

As essências do Pará no Mercado de Ver-o-Peso - Foto Margô Dalla

Quando estou em Belém, como de tudo, cheiro de tudo e vejo de tudo. E quando venho embora, fico com a alma repleta de vontade de logo voltar.


Sou paraense, sou papa-chibé.

*Jerusa Nina - é advogada, estudou Música e Direito, acaba de lançar seu livro “ O Piano” pela editora Giostri no Teatro dos 4 –Rio. Faz parte da Roda de Escrevinhadores.


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