sábado, 25 de abril de 2015

Imigrar

Crônica poética de Euler Rocha que fala sobre o sentimento de um imigrante.



IMIGRAR

Imigrar é se desapegar.

É se lançar...

É conhecer culturas…

Novas aventuras...

Totalmente desprotegido se jogar ao desconhecido.

É calejar de saudade...

E pedir de caneca, gestos de bondade.

Romper com raízes...

E criar cicatrizes.

É chegar desprevenido a mercê de bandidos.

Confiar no desconhecido que logo te tornas arrependido.

Receber sorrisos e de início acreditar que são verdadeiros abraços...

E mais tarde perceber que são totalmente falsos.

Viver na insegurança de um futuro que de real só há a esperança.

É ir e voltar em eternas despedidas, que te faz refém dar idas e vindas.

É sofrer da Síndrome do Aeroporto, da qual os sintomas passam por dor no peito, taquicardia, lacrimejamento, arrependimento, dúvidas, inseguranças, vontade de ficar, vontade de voltar.

É abraçar os mais velhos na despedida

E não saber se ainda os veremos com vida.

Imigrar para uns é sofrer, para outros é vencer.

Para os que sofrem em demasia, imigrar passa a significar prisão, escravidão.

Vira mesmo uma patologia, uma enfermidade…

Que a cura está no voltar ao seu país, à sua cidade.

Para os que vencem imigrar às vezes é meio dúbio; uma mescla de vitória merecida com a alma dividida.

Não há ao seu redor um amigo de infância…

Não há como partilhar as lembranças de criança.

A pergunta: "Está valendo a pena?" é uma constante neste tema.

Conclusões a parte, imigrar é fazer valer.

Vencendo ou perdendo, é fazer do perder um novo saber.

É ser o ator principal de uma peça apresentada no estrangeiro,

Onde ninguém lhe entende,

Mas você se faz presente.

É formar guetos,

porque é o jeito!

É buscar calor…

É fugir da dor…

E no meio dos novos amigos, até nos sentimos queridos.

Senão morremos de solidão…

Senão vivemos em solidão.

Passamos a ter um sentimento agridoce…

O doce e o salgado se misturam num coração dividido, que sente os dois sabores despendidos.

A vida tem um ponto onde foi bifurcada, onde pegamos o caminho que sai do caminho.

O curso natural é mudado e criamos um novo caminho, onde não ficam pegadas marcadas no chão, porque é um caminho de solo duro, que na maioria das vezes não conseguimos voltar, porque não há pegadas, que indiquem o caminho de volta.

Imigrar é  transpor um oceano de dificuldades …e chegar em uma terra nova com um futuro sem muita especificidade.

Enfim, imigrar é sair de si mesmo, para mais tarde tentar se reencontrar…

É se desacomodar, para mais tarde achar algo mais cômodo…

É buscar um novo mundo e fazer dele o seu próprio mundo.

Com perdas e ganhos…

Com encontros e desencontros…

Tropeçando, caindo e levantando…

E o mais importante, é o não desistir e sim o persistir rumo ao objetivo fixado, ao sonho idealizado.

*Euler Rocha é brasileiro/poeta/dentista e mora em Amsterdã. Esse poema é de 2013.

*Foto arquivo do autor.