domingo, 8 de maio de 2011

Cozinhando com mamãe!!!


Sempre acordo com saudades da minha casa no Brasil!!! No silêncio, Henk ainda dormindo, lembro de nossos cafés da manhã recheado de delícias; e especialmente hoje, dia das mães, um sentimento de nostalgia me toma ao recordar Camila, minha filha, durante muitos anos me trazendo uma bandeja de café sempre com um bilhetinho amoroso. Saudades da minha Camila e da minha mãe Ruth que também me ensinou os segredos da cozinha. 
Margô

O texto de hoje, de Tatiana Mota, fala sobre as cozinhas brasileiras - sobre as tias, sobre as mães e seus ensinamentos. 
Oferecemos também, o clip do ator Wagner Moura que canta para a mãe.

Enjoy!!!
Júlia&Margô


A vida em outro país me traz várias reflexões sobre o viver aqui e lá. Ao comparar nossos hábitos com o comer dos holandeses percebi a importância cultural da comida na vida do brasileiro. Qualquer ocasião, de uma simples visita a um casamento, a gulodice domina todos os rituais sociais. O alimento se conecta diretamente ao coração e trazemos na memória delícias preparadas pelos pais, avós ou alguém bem querido. 
Assim é para mim. Encontro em minhas reminiscências dezenas de mulheres em uma cozinha de fazenda, preparando pamonha. Eu pequena olhando panelas gigantes e observando o mistério daquele líquido amarelado, que era milho, mas de repente se convertia em minha sobremesa favorita. Conseguia às vezes dar o nó nas sacolas de palha com um barbante. Lembro-me também de ver a vovó preparando biscoito de queijo e seu feijãozinho, o mais saboroso que provei. 
E para minha sorte a outra vozinha também tinha seus quitutes. Seu vatapá era prato famoso, mas gostava mesmo das coxinhas que preparávamos juntas, da paçoca que ela fazia, essa doce, e até do macarrão nissin com molho avermelhado, delicioso só por ser feito por ela. Também não me esqueço das fugas que fazia com minha irmã para provar as pizzas do Seu João em nossa pizzaria. Ele também preparava gemada como uma batedeira, pronta em poucos minutos, depois nos assustava virando o prato de cabeça para baixo. Havia também o bolinho de chuva da Dona Anastácia, e eu vibrava quando ela chegava com aquele prato de bolinhos perfeitamente redondos e açucarados, não é melhor bolinho imaginário do mundo?
Não obstante, quando adulta, ao me deparar com as caçarolas, o encanto havia desaparecido. Sozinha em minha cozinha minúscula, não havia qualquer inspiração. Anos e anos depois, já em São Paulo fui aprender a cozinhar na escola. O chef Carlos Ribeiro ministra cursos fantásticos no Na Cozinha, e a partir dali algo começou a mudar. Mas a lida com a cozinha estava ainda longe da familiaridade para mim, foi pois que feri levemente meu gentil professor com aquela faca enorme de 7 polegadas, e ele somente me revelou o ocorrido ao final do curso, para que eu não desistisse.
Já na Holanda surgiu grande necessidade de trazer novamente aqueles gostinhos que ficaram na terra natal. O primeiro desafio é ter que lidar com a ausência das matérias primas que abundam no Brasil. Fui encontrando aos poucos um item ali, outro aqui, até porque não podemos sempre ir na lojinha de produtos brasileiros para comprar um pacote de polvilho por quase 4 euros. Encontro o leite condensado na seção de produtos importados, apesar de ser do norte da Holanda, de Friesland. A salsicha defumada que se chama rookworst faz as vezes de lingüiça de feijão.


Começou a surgir uma satisfação com o exercício culinário, para mim novo. Aprender a fazer o ponto de brigadeiro, assar um bolinho, fazer pudim, percebi o grande fascínio que essas comidas exercem sobre mim, admirava-me ao preparar os ingredientes e me deslumbrava com a metamorfose da massa. Ao preparar os pratos corriqueiros da nossa cozinha, como o arroz e o feijão, percebi que acumulara várias sugestões das mais queridas figuras. Meu feijão tem o toque de manteiga da Lelê, um monte de alho como o feijãozinho da Adri, um caldo consistente como o da vovó Tina e às vezes umas linguicinhas tais quais as da vó Maria. Preparo aquele cachorro quente com molho saboroso tal qual a tia Binha e uso a receita de tahine com mel e os produtos natureba da tia Dani.
Minha cozinha então fica cheia, quase não consigo me mover com essa gente toda trazendo sua alquimia para o fundo da minha panela, e jamais me sinto só. Esses detalhes que não se encontram em livros tornam a comida de cada um ainda mais única e especial. A vida pode ser mais doce e temperada quando nos abastecemo desse alimento que nutre a alma.
Da maior mestre ainda não falei. Mas ela é sem dúvida a grande referência que tenho para a lida com as colheres de pau. Ela tem dicas para tudo e um jeito só seu de preparar a comida. A torta de banana e o bife bem solado eram customizados para mim e tinham um sabor que ainda reverbera nas minhas papilas degustativas. Havia um algo há mais saindo daquele forno e fogão e não há quem possa repetir as receitas. Na minha humildade de cozinheira iniciante vou tentando aos poucos decifrar a arte da maior chef que já conheci.
Conversamos muito nesses momentos. Ela me avisa quando devo colocar mais sal ou se preciso acrescentar um pouco mais de água, e também me dá idéias do que fazer quando o prato não sai conforme o programado. Algo muito inesperado então acontece. Eu ganho uma confiança que nunca tive enquanto estava ao fogão, e antes de terminar o preparo do alimento já sei que será saboroso.
Acabo cozinhando muito com a minha mãe. Eu aqui, bem longe do Brasil e ela na outra dimensão da vida sopra em brisas suaves o seu conhecimento. Tudo que não tive tempo de dizer-lhe é preenchido pela nossa comunicação secreta. O carinho enorme no preparo dos pratos, pensando nas pessoas queridas do Brasil e nos amados destinatários da comida é sempre uma grande homenagem a ela, uma maneira de agradecer por todos os “gagais” que me fizeram crescer e me transformaram em um ser melhor, e finalmente capaz de dar aos filhotes um gostinho do inesquecível amor de mãe em forma de comida.  Nesses momentos não há tristeza, não há nada mais que uma saudade muito doce, cheia daquele aroma de baunilha que perfuma o forno.

2 comentários:

  1. Não existem palavras para a alegria que cada comida brasileira traz com sua caseirisse e com os métodos artesanais de fazer.Meu dia das mães foi com meu filho fazendo uma farofa... Éuma delícia a vida de fogão, mesmo quando é chato, nós temos o poder de alquimistas nas mãos, buscando pelo ouro no coração de cada um.

    Um beijo e parabéns pelas publicações e a autora Tatiana (minha irmã)!

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  2. Que linda essa postagem. Quanto sentimento. Adorei. Beijos, Izabel....

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